Pontos-chave
- As maiores investigações do Brasil estão cada vez mais centradas nas empresas comuns e no financiamento de varejo, e não apenas no estereótipo do crime organizado.
- O manual moderno é a camuflagem: camadas de empresas, contadores, faturas e estruturas de investimento que fazem o dinheiro ilícito parecer rotineiro.
- O risco é sistémico: uma governação fraca e incentivos desalinhados podem transformar uma investigação de fraude num choque de confiança para milhões de aforradores.
“Alcançou o cidadão comum”. Foi assim que muitos brasileiros descreveram a onda de ataques de 2025, porque os alvos pareciam menos chefes do crime distantes e mais uma rua normal.
O posto de gasolina, a padaria da esquina, os pequenos varejistas, os motéis, os atacadistas – e até mesmo os produtos de investimento vendidos aos poupadores comuns.
Paulo Henrique Carnaúba, que leciona finanças avançadas no Insper e atua em investigações de fraudes, considera isso um ponto de inflexão. Durante anos, os principais casos foram enquadrados em torno de drogas, corrupção e crimes fiscais clássicos.
Agora, argumenta ele, as autoridades estão a perseguir a maquinaria que torna o dinheiro ilícito utilizável: negócios de grande volume que geram transacções constantes e documentação que pode parecer legítima.
Cleveland Prates, economista da FGVLaw, aponta as pressões de receita de Brasília como outro acelerador. Prates aponta 3 mil inquéritos sobre supressão tributária por meio de fraudes, omissões ou declarações falsas.
Carnaúba cita um “atraso na aprendizagem”: os esquemas crescem à medida que as autoridades mapeiam a propriedade. Nestes casos, os investigadores citaram um líder ligado a 100 empresas e um contabilista que representa 941 empresas.


Dos postos de gasolina às fintechs: como o crime entrou na economia cotidiana do Brasil
Até 15 de dezembro, a Polícia Federal reportou 3.310 operações e R$ 9,6 bilhões (US$ 1,8 bilhão) em bens apreendidos, quase 60% a mais que em 2024.
Num esforço coordenado – Carbono Oculto, Quasar e Tank – os investigadores descreveram 268 empresas diretamente ligadas a um ecossistema.
Os alvos eram parceiros em pelo menos 251 postos de combustível em quatro estados. As autoridades disseram que 60 motéis foram usados para lavar R$ 450 milhões (US$ 83 milhões) de 2020 a 2024.
As autoridades disseram que o grupo controlava mais de 40 fundos de investimento com ativos estimados em R$ 30 bilhões (US$ 5,6 bilhões), uma estrutura que pode confundir o verdadeiro beneficiário.
Nos maiores casos lançados este ano, os investigadores estimam movimentos ilícitos de cerca de R$ 140 bilhões (US$ 26 bilhões). As autoridades chamam hoje a rede de economia paralela.
Fechando as lacunas
O Compliance Zero tornou o risco pessoal. Os investigadores alegaram que o Banco Master carregava R$ 12,2 bilhões (US$ 2,3 bilhões) em carteiras de crédito inexistentes; 1,6 milhão de investidores poderiam recorrer ao FGC para obter cerca de R$ 41 bilhões (US$ 7,6 bilhões) em reembolsos.
Outras investigações: Bóreas (R$ 400 milhões (US$ 74 milhões); R$ 800 milhões (US$ 148 milhões) bloqueados), esquema de opções binárias de 16 de dezembro (mais de R$ 1,2 bilhão (US$ 222 milhões)) e Ambiente 186 de Minas Gerais (R$ 186 milhões (US$ 34 milhões)).
As regras sobre devedores seriados de impostos e identificações de CPF para investidores finais reforçam a supervisão.